Análise Fenomenológica de Vivências Psicológicas que Motivaram a Não Doação de Órgãos no Brasil

Autores

  • Anderson Galante Central de Transplantes do Distrito Federal – Brasília (DF) – Brasil | Escola de Saúde Pública do Distrito Federal – Brasília (DF) – Brasil. https://orcid.org/0000-0002-9521-6538
  • Leila Bernarda Donato Göttems Universidade do Distrito Federal – Escola Superior de Ciências da Saúde – Programa de Pós-Graduação em Ciências para a Saúde – Brasília (DF) – Brasil. https://orcid.org/0000-0002-2675-8085
  • Tommy Akira Goto Universidade Federal de Uberlândia – Faculdade de Psicologia – Programa de Pós-Graduação em Psicologia – Uberlândia (MG) – Brasil. https://orcid.org/0000-0003-4972-7801

Palavras-chave:

Gestão em Saúde, Política de Saúde, Psicologia, Fenomenologia, Solicitação de Consentimento para Doação de Órgãos

Resumo

Objetivos:  Compreender as vivências psicológicas que motivaram a não autorização da doação de órgãos para transplantes. Métodos:  Estudo qualitativo, exploratório, desenvolvido à luz do método psicológico-fenomenológico, com 56 familiares que não autorizaram a doação de órgãos em diferentes regiões geográficas do Brasil, cujos estados apresentaram maior número absoluto de recusas. Resultados:  Desconfiança no sistema de transplante (ST) foi o significado invariante identificado, e os variantes foram prolongamento do sofrimento familiar, insegurança na tomada de decisão, ameaça, pesar, injustiça, desrespeito e desamparo psicológico. Os significados foram estruturados pela percepção dos participantes, a partir da relação com as equipes assistenciais, da ausência de serviços, da carência de manutenção de equipamentos de diagnóstico de morte encefálica, da imagem política brasileira e do desconhecimento das normas da política pública de doação e transplante. Os significados vividos foram analisados e foram identificadas as vivências psicológicas: intencionalidade perceptiva, causalidade psíquica e motivação, impulso de proteção e vivência afetivo-cognitiva que culminam na recusa à doação. A análise identificou que a experiência foi vivida como afetivo-cognitiva. Conclusão:  Os significados revelam que o fator desconfiança esteve presente, em maior ou menor intensidade, em todos os familiares. Há três variáveis psicológicas: I) os familiares têm percepção negativa; II) há motivações afetivas e cognitivas; e III) necessidade de proteção. O desconhecimento da população estudada sobre a operacionalização do ST parece um elemento que tem impactado negativamente o subsistema de doação, e os elementos apontados podem nortear os gestores da política pública no desenvolvimento de ações que informem e esclareçam a sociedade de modo contínuo, e não apenas por campanha anual.

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Publicado

2025-07-21

Como Citar

1.
Galante A, Göttems LBD, Goto TA. Análise Fenomenológica de Vivências Psicológicas que Motivaram a Não Doação de Órgãos no Brasil. bjt [Internet]. 21º de julho de 2025 [citado 22º de julho de 2025];28. Disponível em: https://bjt.emnuvens.com.br/revista/article/view/681

Edição

Seção

Artigo Original